segunda-feira, 30 de abril de 2012

Cozinhadinho: Quando nasce uma paixão

Minha infância foi doce. Lembro das cores, dos cheiros, dos sabores, dos sons... 
Nasci em Machado, uma cidadezinha no sul das Minas Gerais, onde meus avós tinham terras para o cultivo de café e criação de gado. Depois de três anos me mudei com meus pais e minha irmã mais velha para Pouso Alegre, uma cidade maior que fica a uma hora de Machado. Estudava lá durante a semana, mamãe fazia questão de preparar o meu lanche. Espetinhos de frango, sanduíches naturais, pãezinhos recheados, coxinhas e cigarretes eram feitos com muito amor e carinho, depois colocados em minha lancheira. Eu acompanhava todo o processo e ajudava com as massinhas.
 Passava todos os finais de semana, feriados e férias na Fazenda da Ponte.
Sabia o caminho de cor... Os montes verdinhos no horizonte, as barraquinhas de banana, duas cidadezinhas e os silos de metal, que já anunciavam a entrada da cidade; aí vinha a ponte, dois arcos brancos adornando a passagem pelo rio Machado. Um morrinho, alguns sítios e, lá em cima, ela aparecia! Uma grande casa colonial pintada de terracota.
O jardim era lindo e sempre cheio de flores da época... Uma árvore tombada era um dos meus lugares preferidos, onde podia passar horas olhando para a cidade, que se dispunha em extensão sobre uma montanha. 
Meus avós nos esperavam ansiosos, com os armários e geladeiras cheias de delícias... 
Quando bem nova, acordava de madrugadinha para ordenhar as vacas com o meu avô. Levávamos o leite cru para a cozinha, recendendo a cheiro de café e forno, onde a mesa já estava posta com o café quentinho da fazenda, pãezinhos recheados, pão de queijo, pão de minuto, pão de sal, roscas e bolos de todos os tipos, geleias e compotas de fruta. Queijo, manteiga e presunto da Escola Agrícola não podiam faltar, assim como suco das frutas da época. Tomávamos café todos juntos! Tios, primos, avós, irmã e meus pais, conversando e rindo em torno da mesa.
Depois de brincar a manhã toda nos cafezais, pomares e jardins, eu e as outras crianças éramos chamadas para o almoço na copa, onde uma mesa enorme dispunha comidas da fazenda, preparadas pelas mãos caprichosas da minha avó. Frango com quiabo e abobrinha, feijão fresquinho, arroz, angú e uma salada regada à molhinho caseiro eram os meus preferidos...
Depois de uma tarde organizando e lavando nossa casinha de bonecas, eu e minhas primas deixávamos tudo pronto para nossa brincadeira favorita, a "casa abandonada". A brincadeira começava à noite, quando os adultos estavam na sala assistindo às novelas... Saíamos de mansinho e roubávamos as chaves da porta escondido do vô, corríamos até chegar no pomar e acendíamos uma vela. Subíamos o pomar fingindo estarmos perdidas, até que encontrávamos a nossa casinha, com uma placa na porta anunciando "casa abandonada". Ao entrar, encontrávamos uma linda casinha bem arrumada, com caminhas, cobertores, fogãozinho à lenha, um banheirinho improvisado e um chão de vermelhão. Em cima da mesinha, empadinhas, queijo, arroz e outros ingredientes nos aguardavam para o esperado "cozinhadinho", nome que dávamos para a comidinha que preparávamos nas panelinhas de pedra. Limão cravo colhido no pomar, verduras e ervas da hortinha compunham o nosso jantarzinho. Foi ali que tive a minha primeira independência culinária. Panhar as melhores plantinhas, colher o melhor limão, sentir os aromas dos ingredientes, fazer a "cabaninha" com os gravetos dentro do fogãozinho para atear o fogo, faziam parte do maravilhoso e tão cheio de significados ato de cozinhar. Eu não sabia que, daquele inocente cozinhadinho, nasceria uma paixão.




Ainda não tenho nenhuma foto escaneada da casinha de bonecas, por isso resolvi postar esta, que mostra um tantinho como éramos felizes! Aqui, da esquerda para a direita: Jéssica, minha prima linda; Fernanda, minha querida irmã, me abraçando; Angelinha, outra prima super talentosa; O Gui, primo que nos acompanhava nas brincadeiras. <3